segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

A educação artística e musical e a política: dos círculos viciosos a círculos virtuosos

As relações entre as Artes, a educação e as políticas educativas públicas desde o 25 de Abril de 1974 têm-se apresentado como contraditórias e paradoxais. A par da afirmação retórica da sua pertinência na formação das crianças, dos jovens e dos adultos na promoção de uma sociedade mais sensível, criativa e culta, constata-se a dificuldade na construção de políticas públicas, quer no âmbito da educação quer no âmbito da cultura, que deem corpo e cidadania à sua relevância prática e como forma de conhecimento dos diferentes mundos.

Num trabalho recente intitulado “A educação artístico-musical: cenas, atores e políticas” identifiquei 47 intervenções, entre especialistas e grupos de trabalho que, no período compreendido entre 1971 e 2009, procuraram, de diferentes modos, pensar, reorganizar e operacionalizar a relação entre as artes e a educação. Emanados dos diferentes poderes políticos, muito raramente o que foi proposto foi assumido pelos poderes que fizeram a encomenda. E existem propostas de altíssima qualidade, fundamentação e sentido de futuro.

Este círculo vicioso apresenta diferentes formas e tipos de argumentos, mesmo em termos internacionais, onde predominam teses em que se retomam “o ler, escrever e contar”, bem como a funcionalização da formação tendo em conta a ideia de um previsível e futuro mercado de emprego e de trabalho. Ora o que também se constata é que nem o mercado é previsível nem a excessiva funcionalização da formação é determinante na construção de um percurso de vida profissional. São múltiplos os fatores individuais, sociais, culturais, económicos e formativos que interagem nesta relação entre a formação, o emprego e o trabalho.

Tudo isto vem a propósito de mais uma recomendação sobre Educação Artística elaborada pelo Conselho Nacional de Educação (Recomendação n.º 1/2013, DR, 2.ª série - N.º 19 - 28 de janeiro de 2013, pp. 4270-4273) em que se afirma que a “importância da educação artística para todos os envolvidos no sistema de educação e formação reúne hoje um consenso alargado. Decisores políticos com responsabilidade na matéria, passando por investigadores e profissionais ligados à educação, até às mais diversas instâncias da sociedade, reconhecem esta área como fundamental, tanto para o desenvolvimento individual como para o desenvolvimento da sociedade”.

No entanto, “Portugal está longe de conseguir a concretização da educação artística que se entende como desejável e que tem sido conseguida em outros países. Ainda que ela se mantenha estabilizada em academias específicas e se tenha ampliado a setores da população a que antes não chegava - nomeadamente por via das parcerias com conservatórios de música e outros equipamentos culturais disponibilizados pelas comunidades -, não se pode negligenciar o facto de uma grande parte das crianças e jovens ficar privada de aprendizagens artísticas de diversos tipos ao longo da sua escolaridade e numa lógica de continuidade e coerência” (p. 4270). Os diferentes tipos de recomendações do CNE, de indispensável leitura e reflexão, situam-se nos planos (a) do currículo e da organização dos ensinos básico e secundário, (b) ao nível da formação de professores e educadores, (c) ao nível das escolas e das autarquias, (d) e ao nível da investigação, da coordenação e da articulação política e das políticas.

Deste parecer e da sua, mais uma vez, ineficácia política, resta constatar que, apesar dos políticos e das políticas, muitos são os projetos que de norte a sul do país e ilhas, em diferentes tipos de modalidades, formatos, parcerias envolvidas e estéticas, contribuem para ir contrariando os círculos viciosos existentes nos poderes e nos responsáveis políticos, procurando criar círculos virtuosos que contribuam para dar corpo à perspetiva de que “uma educação republicana é uma educação culta" (Joaquim Sapinho). (in Apemnewsletter, fevereiro 2013)